Michael Bublé - 30 setembro 01 outubro altice arena


Perfeito, perfeito era o Altice Arena ter uma daquelas enormes escadarias brancas que aparecem nos filmes de Hollywood. O último degrau acabaria numa pista de dança, onde deslizariam suaves e estonteantes casais, e tudo à volta seriam mesas redondas, onde a única bebida permitida era o champanhe. Só não haveria charutos, por motivos óbvios. Mas nem vai ser necessário fechar os olhos para imaginar o cenário, a música de Michael Bublé tem a magia de nos transportar para um mundo de leveza e glamour, basta que não resistamos ao apelo. Herdeiro dos grandes crooners (Sinatra, Bennett, ou até Harry Connick Jr.), embora obviamente sem a voz do primeiro, Bublé açucarou a herança e os seus discos pingam amor. Vai no décimo, sempre com recurso aos clássicos da era de ouro do cancioneiro americano, mas também sempre com viagens ao futuro, seja através de originais próprios ou de outros compositores, seja mesmo com actualizações estilísticas relevantes. Neste último (“Love”, imaginem), de 2018, a orquestração de “My Funny Valentine” é muito interessante, na ponte que estabelece entre a grande sonoridade do século passado e uma respiração muito contemporânea, a que nem falta uma muito discreta electrónica. Da tal herança, Bublé recebe ainda um apurado sentido de espectáculo, com que transforma cada concerto num serão de histórias e bons momentos. Coisas para eternos apaixonados, nem que a eternidade sejam duas horas no embalo de uma grande orquestra.

Glen Hansard - This Wild Willing ****

Um disco excessivo. Até na duração, mais de uma hora, com várias canções a ultrapassarem a barreira dos seis minutos. Mas excessivo, principalmente, na densidade, seja das letras, histórias de muitas palavras, seja na diversidade instrumental. “Race To The Bottom”, por exemplo, consegue juntar guitarra acústica, percussões muito marcantes, coros, e muitos metais, num tema que tudo deve ao jazz, mas que termina numa toada meio árabe. E é isso mau, especialmente quando, como é o caso, até resulta numa belíssima canção? Nada disso. Cada unidade, cada canção, faz sentido assim, o problema é o todo, de audição um tanto cansativa. Especialmente na segunda metade do disco, em que os temas parecem ter menos fulgor, já longe da belíssima encenação em crescendo da abertura, ou do mesmo esquema em “Fool’s Game”, com as suas reminiscências celtas. Um disco, portanto, para ir consumindo com tempo, como os alimentos pesados o devem ser.