Mark Lanegan - Straight Songs of Sorrow ****

Aos 55, Mark Lanegan faz um balanço de vida. Num livro, “Sing Backwards and Weep”, no qual recorda os anos conturbados dos anos 80 e 90, das drogas aos serviços de urgência de hospitais, os bastidores dos Screeming Trees e dos Queens of the Stone Age (já nos anos 2000), histórias e mais histórias dos amigos aos quais foi sobrevivendo. E também num disco que – diz – resultou da catarse de se expor em público de uma forma tão explícita. Porque, como afirmou numa entrevista recente, “Songs aren’t real life, you know?”. Porque, apesar de assentarem numa base quase sempre autobiográfica, as canções acabam por ser apropriadas pelos ouvintes, virando costas ao criador. Livro e disco deixam claro, logo nos títulos, ao que vêm: a sombra permanente da morte e da dor, como sempre nas canções de Lanegan. Este é o terceiro disco completamente ensopado de electrónica, mas o seu peso só se sente no esmagador tema de abertura. Depois, mercê da urgência com que foi gravado, o disco mostra-nos muitos temas quase simplesmente esboçados. Por isso, apesar do ambiente pesado das letras, as orquestrações permitem alguma respiração e até alguma luz. A dupla acústica/blues de “Hanging On” / “Burying Ground” são disso o exemplo mais acabado. Como, antes, “Apples From a Tree”. “Eden Lost and Found”, com um fundo de órgão Farfisa gravado por telefone evoca tanto Lou Reed que até dói. Lá está, Mark ia gostar de ler isto: Termina com o verbo doer.

Pedro Jóia - Zeca ****

Trinta e três anos após a morte de José Afonso, a sua obra atravessa um longo período de clandestinidade. Devido aos conhecidos problemas relacionados com os direitos das suas canções, há muito que os seus discos não estão à venda, estando também praticamente ausente das plataformas digitais. Tem valido, ao longo destas décadas, a admiração das gerações sucessoras, que em vários formatos e estilos têm vindo a revisitar algumas das mais fascinantes canções portuguesas do século XX. Pedro Jóia tinha 16 anos quando José Afonso morreu, mas também é verdade que por essa altura já manejava a guitarra com grande à-vontade. O disco é consistente com as homenagens que Pedro Jóia tem vindo a fazer a outros grandes nomes da música portuguesa, tal como Carlos Paredes ou o fadista Armandinho, aos quais também dedicou obras completas. Acompanhado apenas pelo percussionista José Salgueiro, devolve-nos alguns dos temas mais conhecidos de Zeca, sempre com um enorme respeito pelos originais. Mesmo quando introduz o flamenco em “Cantigas do Maio”, porque os traços afro-latinos que ouvimos noutros casos, esses, já lá estavam.