Esqueçam tudo o que ouviram de Antony até agora. Os quatro discos de originais eram apenas esboços, ensaios para esta magistral celebração de génio musical e entrega dramática. É impossível voltar a ouvir essas “velhas” canções e não sentir que podiam ser melhores. Como aqui.
Neste CD, gravado ao vivo – embora não pareça, tal é o rigor da interpretação -, Antony revisita 11 das suas melhores canções, acompanhado pela Orquestra de Câmara Nacional da Dinamarca. Não é a primeira vez que se faz acompanhar por uma formação clássica e nos discos de estúdio há apontamentos frequentes de cordas, por exemplo. Mas aqui trata-se de outra coisa. Estamos perante uma abordagem radical, com orquestrações especialmente concebidas para cada canção e que nada devem às concepções de alguns dos maiores compositores da chamada música clássica dos dois últimos séculos (Manuel de Falla, por exemplo, em “Kiss My Name”). Verifica-se, pois, uma transfiguração de todas as canções, não havendo lugar para qualquer dos instrumentos típicos do pop. Mas essa abordagem, que outros já tentaram e que poderia resultar banal, cria momentos de extraordinária beleza, não apenas pela criatividade dos arranjos (“I Fell In Love With a Dead Boy”), mas especialmente pela forma como eles se cruzam com a voz de Antony, abrindo espaço a uma interpretação ainda mais virtuosa e dramática do que nos originais (“Rapture” ou “Epilespy is Dancing”.)
A canção que dá título ao disco é original e foi composta para a peça “The Life and Death of Marina Abramovic”, de Robert Wilson. E há ainda um longo monólogo, em que Antony se rebela contra o domínio masculino do mundo e faz votos para que o futuro seja feminimo, com algumas incursões bem humoradas pela religião. Um manifesto claramente político, mas que aborda com a mesma ternura que coloca nas canções e que o torna realmente único.