Algumas almas sensíveis já nem podem com o nome de Norah
Jones. Pois em verdade vos digo que, não fosse a moça, e este
mega-acontecimento teria ido pelo cano abaixo. Porque, na realidade, é a voz de
Norah que, pontuando a maioria dos temas, acaba por lhes conferir um mínimo de
homogeneidade. E isto por um motivo muito simples: temos de um lado um oleado
quinteto de jazz, ao qual se junta a guitarra e o acompanhante de harmonia de
Willie, e temos do outro lado uma voz que nunca foi grande coisa, mas que está
pura e simplesmente estafada. Acontece que o repertório de Ray Charles exige
uma voz potente e isso é coisa que por aqui não há. O conjunto fica de tal
forma desequilibrado que até os solos orquestrados por Wynton chegam a maçar.
Norah Jones, não tendo um vozeirão, confere aos momentos em que intervém aquela
doçura que lhe conhecemos… e as canções acabam por fazer sentido. Ouça-se, por
exemplo, “Cryin’ Time”, e, no pólo oposto, “I Love You So Much”.
Robbie Robertson - How To Become Clairvoyant ***
Ia começar por uma referência à capa, do género “eis uma
candidata à pior capa do ano”, mas depois reparei que a foto é de Anton
Corbijn, o grande Corbijn. Arrepiei caminho – que percebo eu, afinal, de
fotografia? Vamos, então, à música.
Robbie Robertson, para os mais esquecidos - o homem não
gravava há uma década e meia e, por isso, deve haver pelo menos uma geração que
nunca o ouviu –, integrou uma banda mais ou menos mítica estranhamente chamada
The Band, que gravou umas coisas com Dylan e outras sem Dylan, e que se tornou
mundialmente famosa com o espectáculo de despedida, em formato de filme: “A
Última Valsa” (Martin Scorcese).
A propósito, este disco tem, não uma valsa, mas um tango, “Tango
for Django”, algo experimental, não tanto quanto “Madame X”, de e por Eric
Clapton, com “texturas sonoras” de Trent Reznor. O resto do disco é,
essencialmente, blues. E muito Clapton (assina ou interpreta sete dos 12
temas).
Robbie Robertson empreende uma viagem autobiográfica, aos
anos 60, aos tempos da banda, aos seus guitarristas preferidos (“Axman”), mas
também introspectiva (daí o título do CD), que torna o disco num exercício com
o seu quê de romântico. As guitarras, é claro, são o fio condutor das histórias
e há-as, as guitarras, de todas as sonoridades possíveis, felizmente em doses
aceitáveis. As canções são encenadas, há aqui algo de cinematográfico (a
actividade de Robbie nos últimos anos), o que lhes confere alguma diversidade,
mas igualmente uma modernidade que chega a surpreender. Apesar disso, e tendo
em conta os nomes envolvidos (já falei de Steve Winwood?) e a prolongada
ausência, seria de esperar uma maior densidade. Cumpre, mas…
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Robbie Robertson
k.d. lang - Sing It Loud ****
E eis-nos, então, perante Sing It Loud, o disco com que k.d. lang parece querer abrir uma
nova frente. Trata-se da primeira gravação, em muitos anos, em que surge
acompanhada por uma banda própria, apelidada para o caso de Siss Boom Bang,
nome fantástico. E isto é importante porque se trata, de facto, de um disco de
banda, em que se ouve o conjunto e em que o conjunto tenta fazer sentido. É
claro que o centro de tudo continua a ser a voz única e sensacional de k.d.
lang. Ouça-se a sensualidade de “I Confess”, ou a elasticidade de “A Sleep With
No Dreaming” e fica tudo dito ao fim das duas primeiras canções. Mas, já agora,
a terceira (“The Water’s Edge”) também é muito boa e um excelente exemplo das
guitarras e do órgão que dominam todo o disco.
As canções são todas (co)assinadas pela cantora e até há uma
outra menos razoável (“Inglewood”, por exemplo), havendo apenas uma versão
(“Heaven”, dos Talking Heads), que, sendo interessante, não é nada do outro
mundo. Para primeiro disco de uma nova fase, é prometedor. Falta perceber como
continua.
Emmylou Harris - Hard Bargain ***
Ah, essa tentação de regressar aos lugares onde fomos
felizes! Doce ilusão. Passam agora 38 anos que Gram Parsons, alquimista do
country-rock, se passou deste para outro mundo, deixando a jovem Emmylou
afogada em desespero por um amor que tão pouco durou. Quatro décadas depois,
esta “Lonely Girl”, como se define numa das canções, regressa a esse ano que a
deu a conhecer ao mundo da música e dedica a Gram uma segunda canção (a
primeira fora “Boulder to Birmingham”, em 1975). “The Road”, que abre o disco, é
mais que uma canção de amor, é uma prova da devoção que perpassa um pouco por
toda a obra de Emmylou Harris, muito especialmente pela fase pós-Wrecking Ball (1995), o disco que marca
a sua ruptura com Nashville, a opção pela country alternativa e também a
assumpção enquanto autora.
Aqui chegados, é necessário fazer uma ou duas advertências.
Emmylou Harris ficará para a história como uma das mais belas vozes da country,
sendo a sua verdadeira especialidade a gravação de versões. Enquanto autora, se
é verdade que esta fase mais recente comporta uma ou outra canção mais bem
conseguida, o balanço global não é famoso.
Acontece que, neste disco, a voz de Emmylou, embora ainda
encantatória, dá sinais de fragilidade, e acontece ainda que, só ou
acompanhada, ela escreve 11 das 13 canções. E acontece ainda que a produção
pouco mais consegue que criar alguns ambientes atmosféricos para embrulhar a
voz.
Sendo um disco agradável, em que tudo parece estar no sítio,
não deixa de ser uma peça um tanto monótona, sem chama. É disso exemplo a
evocação da amiga Kate McGarrigle (“Darlin’ Kate”), que certamente será
autêntica, sentida, mas que é também confrangedoramente banal. O melhorzinho
ainda acaba por ser o tema que dá título ao disco, mas esse é assinado por… Ron
Sexsmith. Lá está, as versões!
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