Tom Petty and The Heartbreakers - Mojo ***


Pronto, já todos percebemos: Tom Petty sabe escrever e interpretar blues. Podemos continuar a ouvir música interessante? Ah não? É preciso explicar? Então é assim…
Tom Petty anda perdido há umas três décadas, precisamente desde que decidiu gravar o primeiro disco. O homem começou por ser confundido com o punk, e depois compararam-no a Springsteen, e depois (enfim…) a Dylan, e por aí fora. E tudo isto porquê? Simples – Tom e os seus Heartbreakers nunca conseguiram encontrar uma voz própria e, acima de tudo, marcante. Fizeram, por isso, discos sofríveis, aceitáveis até, mas nunca brilhantes.
Este Mojo não foge à regra. É um tratado de blues. Há-os de todos os estilos – à la Clapton (“Running Man’s Bible”, psicadélicos “First Flash of Freedom”, talkin’, pesados, leves, quase-reaggae (“Don’t Pull Me Over”) e até (sim) dylanianos (“No Reason To Cry”). Tudo muito certinho. Excepto a emoção de que estas coisas são feitas e que por aqui não mora. Enfim, o costume.

Regina Spektor e Chris Isaak


O Cool Jazz Fest tem vindo a afirmar-se como um dos mais interessantes festivais de Verão em Portugal. Desdobrando-se por todo o mês de Julho, em vários e inesperados palcos de Cascais e Mafra, apresenta muito mais que o jazz e arredores indiciados no título. Este ano traz-nos , por exemplo, Elvis Costello e o grande Solomon Burke.
As honras de abertura vão, porém, para dois nomes pop que pouco ou nada têm comum.
Regina Spektor é uma russa que cresceu nos meios musicais de Nova Iorque. Da Moscovo natal nada lhe ficou, à excepção talvez do piano de que é inseparável. Faz uma música de autor, pouco comercial, sofisticada, apesar de nunca perder de vista os cânones da pop actual.
A sua primeira actuação em Portugal basear-se-á nos dois primeiros discos de originais: Begin To Hope (2006) e Far (2009), sendo que as potencialidades das canções e a versatilidade da artista prometem uma noite luminosa e de improvisos.
Chris Isaak é de outra colheita. Californiano, na casa dos 50, evoca os anos 50 e 60, na vertente melancólica, assumindo-se como herdeiro de Roy Orbison e das suas canções de sofredor apaixonado e abandonado.
Tem uma canção que já toda a gente ouviu, embora talvez não saiba nomear (“Wicked Game”), representativa da extrema sensualidade que marca a sua obra.
Após um jejum de sete anos, lançou um disco em 2009 (Mr. Lucky), que será a base da actuação em Portugal, naquela que promete ser a noite romântica do festival.

Karen Elson - The Ghost Who Walks ****


Karen Elson andou nas capas da Vogue e fez anúncios para Yves Saint Laurent, o que faz dela mais uma supermodelo reciclada em cantora. Dizer isto é de uma injustiça tremenda. Como tremenda seria a injustiça de a tratar, apenas, pela actual mulher de Jack White. Na verdade, Karen tem uma queda antiga pela música, que a levou a participar em alguns projectos sem história. E, mais importante, na estreia a solo mostra que tem unhas para esta guitarra: as canções, quase todas de sua exclusiva autoria, são boas, e a voz, não sendo nada do outro mundo, é muito agradável.
É claro que a presença, como produtor, de Jack White sente-se um pouco por todo o lado, especialmente nos pormenores que fazem a diferença.
Sendo a sua primeira gravação, Karen Elson parece ter querido mostrar que tanto se sente à vontade no country (“The Last Laugh”), como no folk do Inglaterra natal (“Lunasa”), como nas canções mais rock a lembrar, sim, os Whitestripes.

Roky Erickson w/ Okkervil River - True Love Castout All Evil ****


Aviso: esta música pode causar loucura.  Foi o que aconteceu com quem a compôs e agora a reinterpreta. Roky Erickson foi um dos génios loucos dos anos 60, com aquela que é considerada uma das primeiras bandas psicadélicas, os 13th Floor Elevators. Nas décadas que se seguiram, foi mais louco que génio, com passagens registadas por hospícios e prisões dos EUA.
Agora, aos 63, apoiado pelas guitarras, vozes e produção dos Okkervil River, expoentes indie do seu Texas natal, ressuscita para nos mostrar 12 das canções, quase autobiográficas, que foram ficando espalhadas e perdidas pela sua discografia.
É um disco belo e sufocante. Há peças dolorosas (“Goodbye Sweet Dreams”), agrestes a fazer lembrar o registo que mais o caracterizou (“John Lawman”), mas igualmente canções de grande beleza e intensidade lírica (“Forever”), que os mais distraídos poderiam julgar fazerem parte de alguma das últimas gravações de Dylan. O lado menos sombrio do génio.

Avi Buffalo - Avi Buffalo ****


A primeira canção mantém a dúvida até ao último segundo: feminino ou masculino? E só no segundo tema (o primeiro single, “What’s In It For?”) percebemos que se trata de um “ele”, mas que ainda não mudou a voz (e talvez já não mude).
“Ele” chama-se Avi Zahner-Isenber, teve o bom senso de trocar o apelido por “Buffalo”, vive na Califórnia e tem… 19 anos. Uma das vozes que mais se ouve durante o disco (belo dueto em “One Last”) é de Rebecca, a namorada, e há ainda mais um casalinho adolescente.
Fazem canções maravilhosamente adolescentes, cheias de sol na música e de dúvidas e delírios nas letras. Usam muitas guitarras, entre a simplicidade dos Smiths e o psicadelismo dos Flaming Lips (“Five Little Sluts” lembra o rock erudito dos anos 70), mas também batem palmas e fazem outras coisas claramente precoces. Fazem lembrar Mercury Rev, pela voz falsetto e pelos coros, e Camera Obscura, pelas melodias meio retro.
Nada mau para estreia, senhor Zahner-Isenber.