João Coração - Soberana ***

Comecemos pela maior fragilidade: João Coração não tem a voz límpida, o fraseado certeiro, que estas canções luminosas e vibrantes exigiam. O facto de essa vez surgir imersa, de forma deliberada ou acidental, num som de estúdio um tanto empastelado não ajuda muito. Não faz sentido que, por vezes, tenhamos dificuldade em entender o que está a ser cantado... Isso nota-se mais nas canções de orquestração mais densa – “Amor e Verão”, ou “Miúda” –, já que nos temas mais despidos o quase sussurro até funciona, como em “Dlim Dlom” ou em “Buganvília”. O melhor do disco são, mesmo, as canções, pequenas encenações de histórias de amor e do seu contrário, num universo sempre pop. Guitarras e sintetizadores remetem-nos para o universo romântico de feira, como em “Nunca Mais”, que se esvai na magia de uma caixinha de música executada pelas teclas. “Soberana” rompe um silêncio de 15 anos do autor e talvez a falta de rodagem se note um bocado.

Diogo Clemente - Amo-te e Outras Coisas Pra te Dizer ****

Um disco que tinha tudo para dar certo. Aconteceu. Diogo Clemente é filho de fadista, cantou fado na adolescência, passou pelo Conservatório Nacional, acompanhou Carlos do Carmo em palco e, nos últimos anos, já nos bastidores da produção, deixou o seu nome associado a discos de António Zambujo, Ana Moura, Carolina Deslandes, Bárbara Tinoco, Carminho, Mariza, Raquel Tavares ou Sara Correia. E, no entanto, este primeiro disco em voz própria, não estava programado. Nasceu de um livro de poemas, com o mesmo título, do qual foram saindo estas canções, que o autor considera demasiado intimistas para serem cantadas por outras vozes. O registo, como se esperaria, vai do fado (“Senta-te à Mesa” – uma das duas únicas canções não integralmente de sua autoria), à música de raiz africana (“A Pequena”), ou ao jazz latino (“Sempre”). E vai da extrema simplicidade de uma guitarra baixo ou de nylon a quartetos de cordas. Sofisticado, como seria de esperar.