Gisela João - Inquieta ****

Gisela João nasceu duas décadas depois do 25 de abril, ou seja, mais de duas décadas depois destas canções terem sido gravadas pela primeira vez. Cantá-las, especialmente da forma como o faz, é uma forma dupla de testemunho: a demonstração da sua atualidade; a passagem para novas e futuras gerações. Temos aqui seis canções de José Afonso, uma de Sérgio Godinho, na versão de Capicua, uma de José Mário Branco, outra de Fernando Lopes Graça e, finalmente, “E Depois do Adeus”, talvez na versão mais distante da versão original de Paulo de Carvalho. A maior homenagem que a cantora presta a estas canções é, precisamente, apropriar-se delas e cantá-las em versões muito próprias, que atestam a sua enorme vitalidade e perenidade. Não é um disco de fado, mas, como Gisela já nos habituou, uma gravação predominantemente intimista que não se deixa aprisionar em estilos. Cada canção encenada musicalmente para valorizar a voz. E as letras.

Rui Reininho & Orquestra de Jazz de Matosinhos ****

A Orquestra de Jazz de Matosinhos tem encontrado nas colaborações uma porta de expansão da sua atividade, mas nunca se aventurara a trabalhar com alguém fora do jazz. A inquietação permanente de Rui Reininho tinha-o levado para experiências extra-GNR, mas nunca estivera à frente de uma big band. O casamento só não é mais feliz, porque sabe a pouco: apenas cinco das 12 canções que integram a aventura a solo de Reininho, “20 000 Éguas Submarinas”, de 2021. Passamos, então, de um registo quase totalmente eletrónico para um ambiente menos anguloso, mais quente, de certa forma, humanizado. “NamasTea” e “Fartos do Mar” são os dois temas em que a exuberância dos metais toma conta da cena, num jazz de recorte mais clássico, enquanto “Aqua Regia” mantém o registo experimental original, mas agora com outros instrumentos. A Paulo Borges junta-se agora Alexandre Soares e ainda Paulo Guedes. Um pequeno grande disco, nos 70 anos do Rui.